A preservação do patrimônio arquitetônico de uma cidade tem no progresso um inimigo potencial. Assim como o prefeito de Salvador em 1933, J.J. Seabra, optou pela destruição da Igreja da Sé para dar passagem ao bonde moderno, inúmeros monumentos históricos são postos em risco mundo afora para dar lugar a novos empreendimentos. Ou simplesmente se deterioram por causa do abandono.
De segunda, 27, até 1º de dezembro, arquitetos de diferentes países se reúnem em Salvador, no Arquimemória 5, para trocar experiências sobre preservação de patrimônio edificado. Os encontros serão todos em prédios com grande importância arquitetônica: o Teatro Castro Alves, a Reitoria da Ufba, o Sheraton Hotel da Bahia e o antigo prédio do Colégio Marista, no Canela, que hoje é sede do Ifba.
Para a cidade anfitriã, o maior desafio continua sendo o que fazer com o Centro Histórico, maior casario colonial da América Latina. Restaurado em 1993, o local passa por uma nova requalificação, iniciada em 2010 e ainda indefinida. “Essa nova reforma ensaiou ser diferente, mas na prática repete o mesmo modelo de turismo, lazer e consumo para a classe média-alta. Que não tem demonstrado interesse em ir a essa região da cidade”, declara a arquiteta e professora Márcia Sant’Anna, que se declara cética quanto à viabilidade dos esforços de requalificação do Centro Antigo feitos pelo governo do estado, a prefeitura de Salvador e a iniciativa privada, notadamente os grupos que investiram na reforma do Palace Hotel e na implantação do futuro Fasano Hotel, na Praça Castro Alves.
Ela é autora do livro A cidade-atração: a norma de preservação de áreas centrais no Brasil dos anos 1990, em que analisa as intervenções nos centros de Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo.
“O grande desafio é pensar como os modelos europeus podem funcionar em Salvador. Os problemas sociais e culturais da cidade não são os mesmos de capitais como Paris ou Berlim, por exemplo. A noção do que foi feito em outros lugares do mundo deve funcionar como ferramenta de reflexão e discussão das novas soluções de preservação dos patrimônios históricos”, explica Nivaldo Vieira de Andrade, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB).
No campo da preservação do patrimônio edificado e proteção dos bens culturais da cidade, estratégias de intervenção são planejadas por instituições públicas e privadas com o intuito de aproveitar a colaboração das comunidades locais.
Diante do desafio, surgem propostas que vão desde a transformação do Centro Histórico em um distrito criativo, pensada pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac-BA), até a realização de reformas em imóveis do centro, presente no Projeto Revitalizar, da prefeitura de Salvador.
Como resultado do processo de globalização, os conceitos teóricos de projetos arquitetônicos europeus passaram a ser referências em propostas pensadas para a preservação de edificações antigas da cidade, afirma Andrade.
De acordo com ele, dentro da arena de discussão sobre os projetos de proteção dos bens materiais da cidade, a falta de debate das iniciativas públicas e privadas com a comunidade local resulta em medidas que não favorecem a correta ocupação e preservação dos espaços históricos.
“Na década de 90, um projeto governamental executado no Centro Histórico resultou na expulsão da população de baixa renda. A ideia foi transformar a região em uma espécie de shopping a céu aberto, destinado aos turistas da capital. Para que o problema não ocorra mais uma vez, é fundamental existir o diálogo entre a população e os órgãos responsáveis pela execução dos projetos da cidade”, diz.
A Tarde.
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